Quando indivíduos, desprovidos da palavra de Deus e da fé, observam as adversidades da vida humana na Terra e percebem que tanto os bons quanto os maus enfrentam fragilidades e infortúnios, surge a indagação sobre a existência de um grupo particularmente agradável a Deus, uma verdadeira Igreja. Diante dessa tentação comum, é essencial contemplar os testemunhos nos quais Deus se revelou ao longo da história, incluindo suas obras poderosas, como o êxodo do Egito e a ressurreição dos mortos, além de outros milagres destinados a fortalecer os fiéis.
A convicção de que Deus está formando uma Igreja eterna entre os homens por meio do evangelho deve ser firmemente mantida em nossos corações. Para isso, Deus revelou e pregou suas promessas em todo o mundo, e ao longo da história, sempre houve filhos de Deus que as receberam com verdadeira fé. Por outro lado, aqueles que não creem estão sujeitos à condenação, conforme expresso em João 3:1-11.
A questão que assombra o coração humano é se foi chamado à salvação e com base em quê ocorre essa escolha. Apesar de disputas e controvérsias, uma verdade incontestável é que devemos derivar nossas conclusões sobre a natureza e vontade de Deus de sua palavra, especialmente por meio de seu Filho Jesus Cristo, revelado pelos profetas e apóstolos. Qualquer pensamento sobre a natureza e vontade de Deus fora de sua palavra é inválido.
Com esse princípio fundamental, podemos afirmar que a fonte do pecado reside em nossa rejeição, ou seja, aquele que não se volta para o Senhor Cristo é certamente rejeitado, como expresso em João 3:18. Por outro lado, a única fonte de escolha para a salvação eterna é a misericórdia de Deus, mediante Cristo. O Filho de Deus é enviado e a graça é revelada, pois, sem essa revelação, ninguém seria salvo. A aceitação da promessa com fé é um mandamento inalterável, conforme declarado em Salmos e João, destacando que a salvação é proporcionada pela graça de Deus, sem mérito humano.
Certamente, o mandamento mais elevado e sincero que recebemos é ouvir o Filho de Deus e crer nele, conforme declarado pelo Pai eterno: "Este é o meu Filho amado; a ele ouvi" (Marcos 9:7; Lucas 9. 35). Isso é reiterado em João 16:8, onde é dito que o Espírito Santo convencerá o mundo do pecado, incluindo o pecado de não crer em Cristo.
Todos são eleitos para a bem-aventurança eterna, recebendo consolo e evitando a queda antes da morte, aqueles que, pela fé no Senhor Cristo e por meio da conversão nesta vida, são abençoados. Como afirma Apocalipse 14. 13, "Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor".
É crucial não criar ideias sobre a vontade de Deus fora de sua palavra. A eleição para a salvação eterna ocorre não por meio da lei, mas por causa de Cristo e pela fé. Assim como temos perdão dos pecados, o Espírito Santo e salvação eterna por meio do Senhor Jesus Cristo, pela graça e pela fé, também somos predestinados à bênção eterna por causa de Cristo, por graça, sem mérito próprio, e não por causa da lei. Esse conforto é genuíno, pois todos são chamados a crer no Senhor Cristo.
Duas tentações surgem da ansiedade: a primeira relacionada ao mérito e à gravidade dos pecados; a segunda, à dúvida se a promessa é oferecida a todos. Contra a primeira tentação, devemos encontrar consolo no fato de que a bênção é concedida por causa de Cristo, sem mérito próprio, de forma gratuita, e a graça é mais forte que qualquer pecado, como declara Romanos 5:20. Devemos acreditar que o Filho de Deus é mais poderoso do que todo o poder dos demônios e do pecado.
Quanto à segunda tentação, é vital entender que a pregação é universal, tanto a da punição quanto a da graça. Deus é justo e não faz acepção de pessoas. Ele oferece sua promessa a todos que se voltam para ele e buscam consolo em Cristo. Passagens como João 6:40, Mateus 11:28, João 3:16, Romanos 3:22 e Romanos 10:12 oferecem a promessa a todos que creem, independentemente de quem são, demonstrando que a mensagem é universal e aberta a todos que a buscam.
Primeiro Timóteo 2:4 afirma que "Deus deseja que todos os homens sejam salvos". Essa declaração deve ser compreendida no contexto de Sua vontade, conforme expressa em Sua palavra. Não devemos atribuir vontades contraditórias a Deus, pois tais contradições são voluntárias. A graça e a bênção são oferecidas a todos que temem a ira divina e buscam consolo em Cristo. Versículos como "Vinde a mim todos os que trabalham" e "Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo" evidenciam a universalidade da oferta de graça.
O princípio de que "Deus não faz acepção de pessoas" (Atos 10:34; Colossenses 3:25) é reforçado pela passagem em Isaías 42, que louva a Cristo e destaca a igualdade de todos os homens diante d'Ele. Deus é justo em sua ira contra o pecado, seja em Davi ou em Saul, e Sua misericórdia se estende a todos que buscam refúgio em Sua graça por meio do Salvador.
A promessa divina oferece graça a todos que estão aterrorizados, e todos devem incluir-se nessa oferta, reconhecendo que o maior pecado é recusar crer no Senhor Cristo e rejeitar Sua graça. O Salmo 2 encoraja a "beijar o Filho", e aqueles que confiam nele são abençoados, evitando a ira divina.
Alguém pode expressar dúvidas, questionando se pode acreditar que Deus lhe dê Seu Espírito Santo. A resposta é reconhecer que Deus oferece Sua palavra a todos e deseja conceder o Espírito Santo a todos que o buscam. Aceitando Sua palavra e confiando na promessa, podemos receber o Espírito Santo.
Ao ouvir o evangelho, não devemos persistir conscientemente no pecado ou permanecer em dúvida, aguardando um sinal miraculoso. Em vez disso, devemos confiar na palavra de Deus, permitindo que o Filho de Deus trabalhe em nós e nos fortaleça com Seu Espírito Santo. O pedido constante pela ajuda de Deus é essencial.
João 6:44, "Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não trouxer", destaca que Deus atrai aqueles que desejam ouvir Sua palavra. Se ouvirmos e aprendermos o evangelho, aceitando-o em nossos corações, o próprio Filho de Deus trabalhará em nós. A pregação é universal, oferecendo tanto a mensagem da punição quanto a da graça. Deus não faz acepção de pessoas; Sua promessa é oferecida a todos que se voltam para Ele em busca de conforto em Cristo.
É reconfortante compreender que apenas aqueles que são chamados estão entre os predestinados, ou seja, aqueles que ouvem e aprendem a palavra de Deus. Agradecemos a Deus por nos incluir nesse grupo, onde podemos ouvir e reconhecer o Senhor Jesus Cristo. Agora, chamados, devemos nos voltar para Deus, consolando-nos pela fé em Jesus Cristo e buscando forças para perseverar até o fim.
Essas palavras são destinadas ao conforto daqueles que são chamados, e não é necessário debater por que alguns pagãos permaneceram cegos por tanto tempo. Sua própria maldade e ingratidão são a causa de sua cegueira, pois Deus, em diferentes momentos, revelou Suas promessas e Sua Igreja. Devemos aprender com esses exemplos de ira divina, temendo a Deus sinceramente, vivendo de acordo com Sua verdade e buscando-O em oração.
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Por: Philipp Melanchthon
Extraído de: Loci Comunnes
Ano: 1555






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