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O homem que contava histórias


Escrita por Natália Guerra

Ilustração de Natan Guerra

Publicado originalmente no blog A Cabana do Major.


Lá estava Lúcia. Não importava o tempo que passasse, ela nunca mudaria. Estava observando as estrelas, sentada em uma colina, ao lado do Sr. Digory. As estrelas da verdadeira Nárnia eram ainda mais fascinantes que as da antiga. “Não parecem estrelas,” pensou. “Parecem os olhos das crianças, refletem serenidade.”

Então observou seu velho amigo, Sr. Digory. Ele também não mudara nada. Exceto na forma de tratamento. Agora que estavam na verdadeira Nárnia, não existiam professores ou mestres, ou qualquer outro título. Ninguém precisava aprender com outras pessoas, porque o próprio Aslam lhes ensinava tudo que quisessem.

Lúcia se lembrou de uma pergunta, que há muito tempo queria fazer ao amigo. E quebrou o silêncio.

- Sr. Digory, - fez uma breve pausa; como é que o senhor, que desde criança sempre conheceu o Bosque entre Dois Mundos, nunca se interessou em visitar outros lugares?

- Ah, minha menina! Em toda Nárnia, só poderia imaginar uma pergunta dessas saindo da sua boca. – e sorriu. Eu era uma criança muito curiosa, sabia? Realmente, certa vez não resisti, e com algum custo consegui encontrar o Bosque. Mas dessa vez, havia ido sozinho.

- E encontrou ainda outro mundo?

- Sim, Lúcia. Encontrei um mundo assustador. Era exatamente como nosso mundo, com exceção na forma com que o tempo passava. Não existia um padrão para seu tempo. Quando estávamos tristes, ele se arrastava, como se pesasse toneladas, mas, ao nos alegrarmos, passava tão rápido que nem podíamos reparar.

- Por quanto tempo o senhor ficou lá?

- Uma vida inteira! Exatamente como você e seus irmãos, na primeira vez que chegaram à antiga Nárnia. É claro que quando voltei para casa, nem um minuto havia se passado.

“Assim como você, que em casa era apenas Lúcia e em Nárnia era a Rainha Lúcia, deixei de ser apenas o Digory. Lá, me chamavam de Clive. Eu cresci, conheci pessoas maravilhosas e escrevi livros. Certo dia, pensei ter entrado em meu escritório, mas, ao passar pela porta, voltei para minha casa, como menino.”

- O senhor não teve mais notícias daquele mundo?

- Não, Lucia. Até um belo dia, em que caminhava aqui, na verdadeira Nárnia, com Aslam. Ele me disse que, agora que tinha visto tantas coisas maravilhosas, deveria voltar para aquele mundo onde meu nome era Clive, para contar às crianças as histórias de Nárnia. Ele tocou seu focinho em minha testa e lá estava eu, agora como Clive S. Lewis, com meus 50 anos, entrando no escritório. Sentei à mesa e comecei a escrever. Contei tudo: sobre Nárnia, desde seus primeiros dias, e sobre você e outras crianças que vieram para cá.

- Tudo?

- Tudo que sabia. Mas queria voltar logo para cá, então escrevi o mais depressa que pude. Agora vejo que poderia ter contado ainda mais. E de nada adiantou minha ansiedade, pois Aslam esperou até meu último dia como Clive para que me trouxesse de volta. Quando Aslam viu meu arrependimento por não ter escrito mais detalhes, Ele me disse que aquilo era o suficiente. E me consolou, prometendo que ainda décadas após minha partida, as crianças leriam minhas crônicas.


Conto feito no fim do ano passado, numa tentativa de fazer uma homenagem a C. S Lewis, autor de As Crônicas de Nárnia, no aniversário de 110 anos de seu nascimento.


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Sobre Paulo Matheus

Esposo da Daniele, pai da Sophia, engenheiro, gremista e cristão. Seja bem vindo ao blog, comente e contribua!

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