
Parece ser um absurdo, mas de fato há argumentos para a planicidade da Terra. Há também argumentos sobre o Nazismo ter sido de direita tanto como ter sido de esquerda. Como eu escrevi acima, há de fato argumentos sobre tudo que é verdadeiro, e ainda também sobre coisas que são falsas. Não estou julgando aqui nenhum dos argumentos, mas sobre a natureza de argumentar.
Muitas argumentações foram apresentadas para sustentar teorias que hoje em dia praticamente ninguém acredita. Mas a maioria das pessoas não acredita nessas teorias, pois lhes foram apresentadas contra-argumentações que, teoricamente, refutam o argumento anteriormente apresentado e propondo uma nova interpretação à realidade. Mas o fato de existir argumento à favor de uma teoria não implica necessariamente que tal teoria é verdadeira.
É até aceitável sustentar um argumento por sua solidez lógica, mas isso de nenhuma forma implica que o argumento em si é verdadeiro e que não há posições contrárias que possam invalidar o argumento. Isso me lembra do trecho do livro "O homem sem qualidades", que diz: "Imagine o que acontece hoje em dia: quando um homem importante coloca uma idéia no mundo, ela é imediatamente submetida a um processo de distribuição que consta de simpatia e repulsa; primeiro, os admiradores arrancam grandes nacos que mais lhes agradam, e devoram o seu mestre como raposas devoram carniça; depois, os adversários eliminam os pontos fracos, e, em breve, de toda a façanha nada sobra senão uma provisão de aforismos, dos quais amigos e inimigos se servem. O resultado é uma ambigüidade generalizada. Não existe um sim no qual não se possa pendurar um não. Você pode fazer o que quiser, sempre encontrará vinte das mais belas idéias a favor e, se procurar, vinte contra."
O argumento depende primeiramente de sua validade. Mas também de sua consequência conclusiva seguir necessariamente de suas premissas, que precisam ser verdadeiras. E mais: é preciso que a teoria resista a contra-argumentos que possam refutar a teoria. Mas é também verdade que os próprios contra-argumentos podem sofrer com algum outro contra-argumento, que invalida a suposta refutação. Nesse sentido, o debate pode se estender para uma longa batalha de argumentos contra e à favor de uma teoria qualquer.
O fato é que muitas vezes ignoramos as contra-argumentações e procuramos argumentos para tudo que queremos provar. Nesse procedimento, já temos respostas prontas para as contra-argumentações daquilo que sustentamos, num procedimento de pura vaidade e tentativa de demonstrar toda nossa incapacidade de ouvir com atenção argumentos contrários aos que sustentamos. Mas é também evidente que não devemos suspender o juízo sobre qualquer tipo de conhecimento apenas pelo fato de haver argumentos para tudo. Creio que devemos é analisar qual argumento se aproxima mais com a realidade para então sustentarmos ele como sendo o mais próximo da verdade, e aceitar a mudança de opinião, se for o caso.
Pode ser o caso que há sim algumas vezes em que vemos argumentos mais sólidos do que aqueles que sustentamos e que, deveriam mudar tanto o modo como vemos o mundo quanto implicar em algo mais que ações de nosso pensamento, isto é, o nosso procedimento prático no mundo. Não deveria ser vergonhoso mudar o procedimento de nossas ações quando somos convencidos de uma ideia, mas é um fato de que um argumento possui muito mais influência em nossos pensamentos do aquilo que deveria se desenrolar na vida prática. Tal me parece ser a razão de parecer mais fácil ficar disputando argumentações infinitas e buscando argumentos e rejeitando contra-argumentos para sustentar uma teoria: a disputa fica mais interessante quando se está apenas no pensamento e não na realidade, pois talvez tanto o mudar de opinião quanto agir coerentemente com isso é tido como humilhante para muitas pessoas. Isso por que devemos primeiramente admitir que estávamos errados. E depois por que talvez dê algum trabalho mudar o hábito.
Talvez em algum texto eu apresente uma formulação lógica complexa (também é aparentemente verdadeiro que o complexo é mais convincente) de que devemos amar o nosso próximo. Segue-se necessariamente que estou amando meu próximo? Não parece ser o caso que seja assim sempre. Talvez surgirão muitos argumentos contra e à favor da prova lógica, mas não se segue que as pessoas vão agir coerentemente com o que estão argumentando.
Logo, pode ser o caso em que nossa incapacidade de agir corretamente influencie em como e no quê queremos argumentar, sempre procurando uma forma de dar razão aos argumentos para sustentar alguma ideia, ainda que não sejamos coerentes com ela. Talvez alguém escreva contra essa postagem. Mas o que me importa agora é estar atento para o que estou argumentando e ser coerente com isso, e ouvir com atenção argumentos opostos ou que ajudem a melhorar tanto o procedimento intelectual quanto prático.
Por: Alisson Henrique de Souza
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